O interior do Cessna C560 XLS+, avião em que morreu o então candidato
presidencial Eduardo Campos, tem muitas diferenças em relação aos outros
modelos da mesma família, afirmam um instrutor e um piloto
familiarizados com essas aeronaves e ouvidos pelo G1.
Os pilotos que comandavam o jato no momento da queda não estavam em
situação irregular, mas não tinham a habilitação específica para
conduzir o C560 XLS+, de acordo com a investigação do acidente.
Segundo os documentos da tripulação, tanto o piloto, Marcos Martins,
quanto o copiloto, Geraldo Magela Barbosa, eram habilitados só para voar
em modelos anteriores. Um mês antes do acidente, a Agência Nacional de
Aviação Civil (Anac) passou a solicitar um treinamento de diferenças entre os modelos, algo que seria exigência para os dois somente em 2015 (leia detalhes mais abaixo).
O C560XLS+ do acidente é mais moderno e com sistemas aviônicos diferentes, afirmou na segunda (26)
o tenente-coronel Raul de Souza, do Centro de Investigação e Prevenção
de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), que está à frente da apuração.
Gastão Coimbra, instrutor de sistemas em um curso em solo para pilotos
de diferentes modelos de Cessna, diz que “a cabine do XLS+ é muito
diferente das cabines dos demais aviões da mesma família. Praticamente
não há nada no mesmo lugar. Não é uma pequena diferença. Nada que você
olhe está no mesmo lugar. É um avião mais moderno, mais fácil de se
operar”.
André Rossi, que pilotou durante 17 meses o Cessna 560XLS+, diz que “o
avião em tese é o mesmo, tanto que a Anac até então expedia uma carteira
que autorizava os pilotos a voarem toda a família 560. Mas a tecnologia
embarcada é outra, bem diferente, a posição dos botões no painel é
diferente, o alarme é digital e não analógico, como era até a versão
anterior”.
Veja as diferenças apontadas pelo instrutor Geraldo Magela entre o avião que caiu e o que que os pilotos tinham habilitação:
1- Painel: moderno, o jato que Campos usava tinha um
sistema de aviônica (parte eletrônica) do painel produzido pela
fabricante Rockwell Collins Pro Line 21. Os modelos anteriores dos
aviões da família - e que os pilotos de Campos estavam habilitados -,
foram fabricados pela Honeywell e apresentavam diferenças no padrão de
apresentação das telas e no computador de bordo.
2- Manetes: no 560XLS+, o sistema de configuração
das manetes (sistema que comanda a potência dos motores) possui posições
fixas e pré-definidas nas quais o motor ajusta os parâmetros ideais
conforme o voo. Já nas versões anteriores do Cessna 560, o piloto
movimenta a manete, definindo a potência.
3- Cockpit: o
avião acidentado tinha os botões do painel sempre apagados durante o
voo, com exceção das telas frontais, diferindo completamente das versões
anteriores. Os botões também mudam radicalmente. Enquanto nas versões
do Cessna 560 até o XLS eles funcionam por movimentação para cima e para
baixo, no XLS+ os botões são de pressão, do tipo puxe-empurre.
4- Luz de emergência: até
o Cessna 560 XLS, uma luz de emergência se acendia no painel quando
necessário. Já no Cessna 560XLS+, não há mais luzes de emergência. A
informação sobre a pane aparece escrita na tela.
5- Movimento do estabilizador:
o jato XLS+ possui um sistema de movimento de estabilizador para
melhorar a performance do avião. O sistema exige que os pilotos recolham
os flaps (instrumentos na asa que reduzem a velocidade de aviões) após a
decolagem enquanto o avião estiver abaixo de 200 nós de velocidade (370
km/h), para evitar falhas no sensor de velocidade, que podem levar ao
abaixamento acentuado do nariz do avião.
6- Abaixamento do trem de pouso em emergência: a alavanca que comanda o abaixamento do trem de pouso em emergência foi desmembrada em duas no XLS+.
Condições de treinamento
O Cenipa quer saber agora se, mesmo sem a habilitação correta para o
modelo, Martins e Barbosa “estavam em condições de treinamento e
qualificação compatíveis com aquele equipamento”.
Para a Anac, os pilotos estavam habilitados e o treinamento de
transição para o avião que pilotavam só seria exigido quando eles
renovassem suas habilitações, algo que começou a vigorar um mês antes do
acidente. O comandante Marcos Martins deveria fazer a renovação do
documento em janeiro de 2015 e o copiloto, em meio deste ano.
Em julho de 2014, a Anac publicou a Instrução Suplementar (IS) 61-004,
uma legislação que traz a lista de habilitações que são emitidas para
licenças e os requisitos para verificação de proficiência dos pilotos.
Pela primeira vez, a agência passou a exigir um treinamento diferente e a
comprovação, em um teste em voo, para que os pilotos pudessem mudar de
avião da mesma família.
Fonte: G1