Aviões novos, comprados pelo governo federal, estão abandonados há quase
dois anos em meio a grama alta, sujeira, pó e insetos. Três modelos de
instrução AMT-600 Guri, de propriedade da Agência Nacional de Aviação
Civil (Anac) e que, segundo o fabricante, valem R$ 200 mil cada um,
estão parados sem abrigo no Aeroporto de Jacarepaguá, no
Rio
de Janeiro, desde setembro de 2010.
Os aviões, de prefixos PR-PAC, PR-WAV e PR-DLS, foram fabricados em
2008, 2009 e 2010, respectivamente, e estão em uma área ao lado do
hangar da escola de pilotos Aeroclube do Brasil, descobertos e sem
segurança.
Segundo um piloto que viu as aeronaves de perto, o painel de um dos
aviões - o de prefixo PR-WAV - mostra que ele tem apenas 11 horas de voo
-- o que equivalente ao percurso entre Porto Alegre, local da fábrica, e
o Rio.
Mais cinco aviões de instrução Aero Boero, também de propriedade da
Anac e comprados cada um por R$ 150 mil na década de 90, estão
abandonados no Aeroclube de
Juiz
de Fora (MG), junto a carcaças e aeronaves com defeitos.
Os modelos AB-115, de prefixo PP-GAR, PP-GCV, PP-GJS, PP-FKT e PP-FHQ,
estão em uma área de grama e terra do aeroclube desde novembro de 2004. A
última aeronave foi colocada lá em março de 2005, segundo a Anac.
A agência diz que as aeronaves foram adquiridas pelo antigo
Departamento de Aviação Civil (DAC), da Aeronáutica, extinto em 2006,
quando a agência foi criada, e foram incorporadas ao patrimônio da Anac.
O órgão afirma que ainda estuda a melhor forma de destinação dos
modelos para a aviação de instrução.
O último diretor do DAC, brigadeiro Jorge Godinho, diz desconhecer a
destinação das aeronaves depois que o órgão foi extinto. Ele lembra que,
na época, elas eram compradas pela Aeronáutica e cedidas para
aeroclubes buscando incentivar a formação de novos pilotos e mecânicos.
“Em contrapartida, os aviões tinham de ser mantidos em condições
aeronavegáveis, pois fiscalizávamos isso através dos nossos serviços
regionais”, afirma.
Doação para aeroclubes
O fabricante dos Guris vê como um desperdício o abandono. “Começamos a
produzir este modelo a partir de 1986 para o antigo DAC, quando houve
uma decisão do governo de substituir o Paulistinha, que era o avião de
instrução mais difundido no país, e renovar a frota dos aeroclubes”,
lembra o engenheiro Claudio Barreto Viana, presidente da Aeromot
(fábrica gaúcha que produz o AMT-600).
“Entregamos os primeiros 17 Guris ao DAC ainda no governo de José
Sarney (1985-1990) e depois o modelo sofreu transformações. As
autoridades na época decidiram comprar também o Aero Boero, que é da
Argentina e era mais barato, buscando fazer parceria com o país
vizinho”, recorda Viana.
Um outro contrato, para a venda de mais 20 Guris, foi fechado com o DAC
no início da década. As últimas aeronaves foram entregues para a Anac
entre 2005 e 2010.
“A Anac resolveu mudar a política de mais de 60 anos do DAC, que era
incentivar a formação de novos pilotos através da doação dos aviões para
treinamento. Agora, alguns aeroclubes querem comprar, mas, para eles, é
quase impossível um financiamento”, diz Viana.
A Anac afirma que uma comissão especial foi criada para fazer um
levantamento de todas as aeronaves da agência que estão abandonadas,
analisar sua destinação e os procedimentos para que sejam cedidas.
Segundo a agência, os modelos que estão parados no Aeroporto de
Jacarepaguá serão transferidos para o pátio do centro de treinamento da
Anac, no Rio de Janeiro, mas é necessário autorização da Infraero,
empresa que administra os aeroportos, para movimentação.
O G1
fez um questionamento à Infraero sobre o fato desta solicitação já ter
sido ou não feita, mas até a publicação desta reportagem não houve
resposta.
Sobre a destinação dos Aero Boero abandonados em Juiz de Fora, a Anac
diz que notificará o aeroclube, que é “cessionário dos bens”, para que
haja a manutenção e colocação em lugar adequado, sob pena de aplicação
de sanções.
O presidente do aeroclube, Douglas Fedóceo, diz que está em contato com
a Anac em busca de um destino para as aeronaves.
"Eu mesmo notifiquei a Anac em junho de que os Aero Boero estavam me
tomando espaço e eu precisava dos hangares para locação. Quando o DAC
foi extinto, estes aviões vieram dos aeroclubes do interior. Foram
trazidos para Juiz de Fora e Maricá e ficaram aí", afirma Fedóceo.
"Eu não quero mais estas aeronaves, não nos interessa mais a cessão. O
acordo era que viria dinheiro para recuperá-las, e isso não ocorreu até
agora. A Anac já me respondeu que irá buscar uma solução para o
problema: tirá-las de lá ou fazer um leilão", acrescenta o presidente do
aeroclube de Juiz de Fora. Segundo ele, apenas três unidades de Aero
Boero ainda estão em condições de voo. Há ainda outras sete carcaças ou
aviões defeituosos no local.
Fonte: G1 (Colaborou Janaina Carvalho, do G1 RJ)